The Libertines conta-nos a história de amor-quase ódio (porque nunca o chega a ser) por entre o caos e a autodestruição das vidas de Pete Doherty e Carl Barât, autoproclamados como alma gémeas.
Quando temos um álbum com tanta história por trás como este é difícil saber por onde começar. Neste caso talvez seja melhor ouvir o conselho daquele amigo irritante (todos os temos) que quando nos vê “à rasca” para formar uma linha de raciocínio coerente sugere que comecemos pelo início.
Depois do lançamento do primeiro álbum Up The Bracket seguiram-se meses de discórdias, discussões e concertos sem Doherty (primeiro porque este se recusava e depois porque Barât proibiu) devido á toxicodependência deste, o caminho para a gravação deste longa duração, o segundo dos The Libertines, começou no dia 8 de Outubro de 2003 quando Doherty é libertado depois de 2 meses de encarceramento por assaltar a casa do companheiro de banda. Nesse dia os dois reconciliaram-se e deram um pequeno concerto para 200 pessoas que viria a ser conhecido com “Freedom Gig”. A imortalização deste momento serviu de capa ao álbum.
A mística dessa noite foi desvanecendo quando os problemas de Doherty com as drogas pesadas ressurgiram à superfície.
Prova disso é a primeira canção do álbum “Can’t Stand Me Now”, “you twist and tore our love apart apart” acusa Carl, “No you’ve got it the wrong way round” responde Pete. Durante o resto da canção ouvimo-los como se de um casal discutindo a validade da sua relação se tratasse:
“I know you lie (I know you lie) but
I’m still in love with you (oh oh oh)”
“Have we enough to keep it together?”.
Durante o refrão vão atirando um ao outro a frase “You can’t stand me now” , Carl de modo assertivo e seguro e Pete com uma tristeza profunda procurando forças para proferir tais palavras.
Não fora a envolvente que este álbum teve durante a sua conceção e “Last Post On The Bugle” poderia facilmente passar por uma música acerca de amor distante, mas sabendo o historial de Pete e Carl linhas como “Feels like I’ve never been away/Though it’s been longer than I can possibly say” e “I’m glad to see we’re still tight/The bonds that tie a man are tight” ganham novos contornos.
Em “The Saga” parece que Pete toma consciência dos efeitos nefastos que o seu estilo de vida traz: “You let down your friends/And you let down the people/And you let down yourself/And only fools, vultures and undertakers will have any time for you”. Porém ao mesmo tempo quer acreditar que não existe nenhum problema e ataca Carl: “No, no I ain’t got a problem
It’s you with the problem”.
A resposta de Carl é dada logo de seguida em “Road to Ruin”: “How can we make you understand/All you can be is right given in your hand”. Lança também um apelo a Doherty na esperança de o conseguir guiar para longe das drogas: “Trust in me, take me by the hand”.
“What Became Of The Likely Lads” põe fim ao álbum da mesma forma como começou. Também esta faixa poderia ter sido uma conversa entre os dois homens: “Oh, what became of the likely lads?/What became of the dreams we had?”.
Por entre estas canções quase autobiográficas temos pérolas como a enternecedora “Music When The Lights Go Out”, a “apunkalhada” “Arbeit Macht Frei” – “o trabalho liberta” (que tira o titulo da frase que os nazis colocavam sobre os portões dos campos de concentração) com uma crítica mordaz a uma sociedade britânica que se orgulha de ter derrotado os nazis mas, no entanto, se debate com o racismo e a homofobia, e uma favorita do público, “What Katie Did”, que ao contrário do que muito boa gente acredita não é sobre Kate Moss.
Este segundo álbum veio atestar as qualidades musicais e líricas dos The Libertines, porém a tensão entre os “frontmen” culminou na separação da banda que ajudou a trilhar os caminhos para outros conjuntos que hoje correm livremente pelos campos daquilo que nos habituámos a chamar de indie rock.
Acabo com a luz ao fundo do túnel que representa a promessa de novo material a gravar no âmbito dos concertos de reunião confirmados até agora no Hyde Park de Londres e no festival FIB Benicassim em Espanha, dias 5 e 19 de Julho respectivamente. A concretizar-se, cá estaremos para ouvir.