Muita gente saudosa de boa música e de um festival como só Coura sabe ser rumou à freguesia minhota para o primeiro dia da 27.ª edição do Vodafone Paredes de Coura. Os The National foram as estrelas maiores, mas ainda de tarde ouviu-se música de muita qualidade no ‘Couraíso’.
Da Austrália para o Alto Minho, Julia Jacklin trouxe as canções do celebrado Crushing, disco deste ano e segundo da carreira – há muita melancolia e alguma tristeza, mas aqui e ali pontuam por estas cantigas fogachos rock mais intempestivos e celebratórios. Já com alguns fãs nas filas da frente, Jacklin era dos nomes menos conhecidos do primeiro dia, mas foi garantidamente quem mais novos fãs terá conquistado. Merece-os.
Do outro lado do Oceano, os Boogarins trouxeram até Coura o seu quarto álbum, o soturno Sombrou Dúvida. Isso não impediu, no entanto, que este concerto estivesse recheado de momentos soalheiros, todos eles motivados pelo sorriso e a voz melodiosa do guitarrista Dinho Almeida. Para além deste novo disco, o grupo dedicou ainda uma secção do concerto para lembrar o seu primeiro disco, As Plantas Que Curam. O grupo realçou ainda que este era o maior concerto que alguma vez deram, um comentário interessante visto que, à partida, a música descontraída e soalheira dos Boogarins encaixar perfeitamente com o ambiente do festival. O ponto alto do concerto foi a queda livre de “Passeio”, a canção que fecha o último álbum, numa versão estendida que expõe o virtuosismo de cada músico.
De volta à Austrália, fomos buscar os Parcels, grupo que deu um dos concertos mais surpreendentes da edição de 2018 do Super Bock Super Rock – e que diferença se fez sentir nas duas atuações. Depois de terem percorrido meio mundo em promoção do seu disco de estreia homónimo, os Parcels são uma máquina imaculadamente oleada, tocando todas as suas músicas com uma qualidade tão próxima da do álbum, que nos fez desconfiar por vezes se não estariam a fazer playback. Depois de uma torrente das músicas mais imediatas do disco, como as simbióticas “Comedown” e “Lightenup” e “Bemyself” num arranjo novo, mais em linha com a sonoridade habitual do grupo, o clima abrandou um bocado com “Withorwithoutyou” para explodir novamente na secção instrumental de “Everyroad”. Num momento memorável, Jules Crommelin e Noah Hill posicionaram-se ao lado do baterista Anatole Serret executando uma coreografia kitsch a meio de “Iknowhowifeel”, cada um deixando um loop a ocupar o seu lugar. Aquando do acorde final de “Tieduprightnow” o público, generosamente recompensado, proclamou sem ambiguidades o seu amor pelos australianos.
Sem surpresas, coube aos National o maior banho de multidão da noite. A expetativa era grande, não obstante a atuação de quinta-feira estar longe de ser das primeiras do grupo em Portugal. Na bagagem, há disco novo e muito repertório passado onde buscar pérolas. Problema número um: o novo I Am Easy To Find é intimista demais para recintos ao ar livre, desinspirado demais na comparação com o passado. Problema número dois: já vimos os músicos mais oleados, coesos e inspirados. E, mesmo assim, estivemos longe de assistir a um mau concerto: canções como “About Today”, “Fake Empire” ou “Mr. November” são sempre bem-vindas e é sempre um prazer a elas voltar – mas faltou qualquer coisa. Ou talvez tenha sido impressão nossa dada a elevada quantidade de epifanias que se avizinham no certame minhoto: Spiritualized, Suede, Patti Smith ou New Order estão, entre muitos outros, guardados para os dias seguintes.
Texto: Miguel Moura e Pedro Primo Figueiredo || Fotografia: Inês Silva