Por falar em mitos, aqui está um. Toda a história que se segue é envolvida em mistério.
Para mim começou no passado ano quando o festival Primavera Sound anunciou o cartaz completo da sua edição nortenha, da cidade invicta. O bilhete estava já religiosamente guardado desde o primeiro e único nome anunciado durante ainda 1 ou 2 meses. Eram os Blur. Tudo o resto que fosse confirmado era ganhos extra. No meio de Grizzly Bear, Explosions in the Sky, Melody’s Echo Chamber e tantos outros surgia o nome de Rodriguez, Sixto Rodriguez.
Não era nem de perto nem de longe o único nome que não conhecia mas foi aquele que eu sabia estar envolto de algum mistério. Alguma coisa já tinha ouvido, que era músico de geração mais antiga, que tinha saído DVD sobre ele. “Tenho de pesquisar isto tenho”. Pouco tempo depois saía a notícia de que Rodriguez já não iria estar presente no festival por algum motivo qualquer, doença talvez. Batia certo. Mas continuava sem perceber de onde vem este Rodriguez de quem ainda nunca tinha ouvido falar?
O meu mistério em relação ao Sugar Man alcançou outro degrau quando ouço na rádio “Crucify Your Mind”. Que canção! Infusão dilacerante automática no cérebro. Se já tem alguns anos, como nunca passou isto pelos meus ouvidos? Esta melodia, esta letra?
Pois bem. Já tem uns anos de facto. Mais de 40! Que se passou então?
Podemos pôr as coisas neste prisma: que teria acontecido se Bob Dylan, em vez de começar a tocar em bares de Minneapolis? Que teria acontecido se Dylan não tivesse começado a pro-activamente procurar entrar no circuito folk, como o fez localmente entrando no festival de Dinkytown? Provavelmente, com as veias musicais a jorrar-lhe dos braços, teria ficado a tocar algures, como na rua. Foi isso que aconteceu a Rodriguez.
Embora tenha chegado a lançar dois álbuns intitulados Cold Fact, de 1970, e Coming From Reality do ano seguinte, Rodriguez acabou por não ter grande sucesso. Os registos venderam muito pouco nos Estados Unidos. Mas chegaram, no tempo das velhinhas cassetes, à África do Sul. E foi aqui que chegaram às mãos certas, de tal maneira que Rodriguez, neste país africano, tornou-se maior que o próprio Elvis. As canções de Rodriguez tinham uma forte carga política e isso caiu que nem uma luva num país que se debatia com o auge do Apartheid.
Este documentário, realizado pelo sueco Malik Bendjelloul, conta-nos essa história. Dois sul-africanos foram procurar mais sobre o seu ídolo Rodriguez (na altura não havia internet e muito menos youtubes ou wikipedias para ajudar). Começaram por descobrir que Rodriguez se tinha suicidado em palco, imulando-se no seu próprio concerto. Mitos.